Análise: Brasil à beira do colapso fiscal? O diagnóstico alarmante de Maílson da Nóbrega

Em uma entrevista recente à CNN Entrevistas, o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega expressou grande preocupação com uma iminente crise fiscal no Brasil, que ele prevê para os próximos dois ou três anos. Segundo Nóbrega, mais de 90% do orçamento federal já está comprometido com despesas obrigatórias, criando um cenário de engessamento financeiro que pode levar a uma paralisação parcial da máquina pública. Ele enfatiza a urgência de reformas estruturais, mas avalia que o ambiente político atual não favorece mudanças profundas sem um "susto" prévio.
O engessamento orçamentário e seus perigos
O cerne do problema, de acordo com Nóbrega, reside na rigidez orçamentária brasileira:
- Gastos obrigatórios: Atualmente, 96% do orçamento federal está rigidamente vinculado a despesas fixas, como previdência, saúde, educação e programas sociais. Isso deixa apenas 4% para outras prioridades, um percentual que tende a se anular em breve.
- Comparativo internacional: Em contraste, outros países reservam, em média, 50% de seus orçamentos para prioridades flexíveis – chegando a 70% nos EUA. Essa diferença ilustra a crítica situação brasileira, que limita drasticamente a capacidade de investimento e ajuste do país.
- Implicações: Essa inflexibilidade orçamentária impede a adoção de políticas anticíclicas em momentos de crise e aumenta o risco de um "shutdown" (paralisação de serviços públicos essenciais) até 2027, caso a situação não seja revertida.
A inviabilidade de cortes e a urgência de reformas
Nóbrega destaca que as regras atuais tornam a contenção de gastos um desafio quase intransponível:
1. Constituição de 1988:
- A legislação vigente protege despesas como salários e benefícios sociais, tornando cortes permanentes praticamente impossíveis. Contingenciamentos, embora paliativos, não resolvem o problema estrutural.
2. Medidas essenciais: Para Nóbrega, são necessárias mudanças mais profundas, como:
- Uma reforma da previdência "muito mais ousada" que a realizada em 2019.
- O fim da vinculação automática entre o salário mínimo e os benefícios previdenciários, uma das principais pressões sobre os gastos.
3. Consequências da inação:
- Sem essas mudanças, o Brasil continuará a acumular dívidas e a perder credibilidade junto aos investidores, agravando a situação fiscal.
Crises como catalisadoras de reformas
O ex-ministro utiliza a história para fundamentar sua análise:
- Lições do passado: Grandes reformas no Brasil, como o Plano Real e a estabilização econômica dos anos 1990, só avançaram em contextos de crise, quando a sociedade e a classe política perceberam a urgência e a inevitabilidade das mudanças.
- Cenário político atual: Nóbrega critica a falta de ambição nas propostas recentes do governo e a pouca disposição para adotar medidas impopulares, que são, no entanto, cruciais.
- A crise como estímulo: A expectativa é que a crise fiscal, ao eclodir, atue como o "susto" necessário para destravar as reformas. Contudo, ele adverte que o custo social desse ajuste tardio será elevado.
Produtividade como caminho para a estabilidade
Para além dos ajustes fiscais, Nóbrega aponta a produtividade como fator-chave para o futuro do país:
- Crescimento sustentável: O Brasil só retomará um crescimento econômico sustentável com ganhos de produtividade, que dependem diretamente de um ambiente macroeconômico estável e previsível.
- Sanidade orçamentária: Classificando as contas públicas como um "sanatório" devido à sua desorganização, ele defende a implementação de regras fiscais claras para reduzir incertezas, atrair investimentos e, por consequência, impulsionar a produtividade.
O diagnóstico de Maílson da Nóbrega traça um quadro preocupante: o Brasil se encaminha para uma crise fiscal inevitável, com riscos concretos de paralisação de serviços e perda de capacidade de investimento. Embora as soluções técnicas sejam conhecidas – como reformas previdenciária e orçamentária –, a falta de vontade política continua a adiar as mudanças necessárias. O alerta do ex-ministro serve como um chamado urgente para que a sociedade e as elites políticas enfrentem o problema antes que a crise se agrave, evitando um ajuste ainda mais doloroso no futuro. A história brasileira sugere que o avanço só ocorre sob pressão, e, desta vez, o preço da inação pode ser especialmente alto.