Geopolítica BRICS: A entrada do Irã aprofunda tensões com Israel e EUA - O papel do Brasil

A entrada do Irã no Brics, oficializada em 2024, transformou o bloco originalmente formado por cinco grandes economias emergentes em um grupo ampliado de onze países. Porém, essa expansão trouxe também novos desafios geopolíticos. A participação iraniana fez com que os conflitos do país com Israel e Estados Unidos passassem a repercutir diretamente nas negociações internas do grupo.
No contexto da cúpula do Brics que ocorre no Rio de Janeiro nos dias 6 e 7 de julho de 2025, as tensões aumentam após recentes ataques entre Teerã e seus adversários. A ausência de líderes como Xi Jinping (China), Vladimir Putin (Rússia) e do recém-eleito presidente iraniano, Masoud Pezeshkian, representado por seu chanceler, não diminui o peso das discussões que envolvem o papel do bloco diante da escalada no Oriente Médio.
Importância do tema: O Brics diante da crise no Oriente Médio
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O Brics já condenou publicamente, em 24 de junho, os bombardeios sofridos pelo Irã, classificando-os como violações do direito internacional e da Carta das Nações Unidas. No entanto, a nota oficial não nomeou diretamente Israel ou Estados Unidos, revelando divisões internas. O documento reafirma o desejo de uma zona livre de armas nucleares no Oriente Médio, ecoando resoluções anteriores da ONU.
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O Irã, por sua vez, exige um posicionamento mais firme do bloco e se opõe à tradicional defesa do Brics por uma solução de dois Estados no conflito Israel-Palestina, o que aprofunda as tensões internas, especialmente com Índia e Brasil — que mantêm relações estratégicas com Israel.
Relevância estratégica: O papel do Brasil e os limites do Brics
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A ampliação do Brics com a entrada de países como Irã, Egito, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos foi impulsionada por Rússia e China e enfrentou resistência do Brasil. Segundo o professor Oliver Stuenkel, da FGV, o país foi "atropelado" por interesses mais radicais de seus pares e hoje tenta manter um papel equilibrado para não prejudicar negociações com o Ocidente, como a COP 30 em Belém.
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O ministro Mauro Vieira afirma que o Brics deve ser um espaço de concertação política em favor da reforma da governança global e da sustentabilidade. No entanto, analistas apontam que o bloco, apesar de politicamente influente, ainda tem uma estrutura institucional frágil e não funciona como uma aliança militar ou de segurança coletiva. Assim, embora fortaleça o Irã simbolicamente, não oferece proteção prática em conflitos.
O caso da Ucrânia e o duplo padrão nos posicionamentos
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Além do Irã, a Rússia também é um membro em guerra, no caso com a Ucrânia desde 2022. A diferença de tratamento entre os dois conflitos é evidente. O Brics nunca condenou Moscou, enquanto o G7 (grupo das nações mais industrializadas do Ocidente) mantém forte pressão sobre o Kremlin.
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Isso se explica, em parte, pelo funcionamento do Brics, onde todos os membros têm poder de veto e tendem a proteger seus interesses. Como destacou Stuenkel, o bloco evita posições firmes contra seus próprios integrantes, enquanto o G7 protege aliados como Israel. A guerra entre Israel e Palestina, por exemplo, recebeu 16 linhas na última declaração do Brics, enquanto a invasão russa à Ucrânia teve apenas quatro.
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O Brasil mantém a tradição diplomática de defesa da soberania territorial e criticou a invasão russa, embora tenha evitado sanções. Já a presença de mais países árabes e islâmicos no Brics pode reforçar posturas críticas a Israel, aprofundando ainda mais o fosso com o Ocidente.
Um bloco dividido entre influência e limitações
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A entrada do Irã nos Brics representa um marco simbólico de um mundo em transição para a multipolaridade, mas também escancara os dilemas internos do bloco. A diversidade de interesses entre seus membros — que agora inclui regimes autoritários e democracias com visões geopolíticas divergentes — torna difícil a adoção de posições consensuais e efetivas sobre crises internacionais.
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O Brasil, em meio a esse cenário, tenta manter uma posição de equilíbrio e evitar que a cúpula se torne palco para disputas ideológicas que atrapalhem sua estratégia de múltiplos alinhamentos. Ainda assim, a tensão entre blocos globais, como o G7 e os Brics, segue como um dos principais sinais do enfraquecimento de uma ordem internacional unipolar.
O Brics pode não ser um ator militar ou decisivo nas guerras em curso, mas sua relevância política e diplomática cresce ao oferecer um espaço alternativo de diálogo ainda que marcado por contradições profundas e desafios internos.