Moscou 2025: Putin, Lula e Xi. Uma nova ordem mundial? O que o "Dia da Vitória" revela.

No próximo 9 de maio, Vladimir Putin organiza uma das datas mais simbólicas do calendário russo: o Dia da Vitória, que celebra os 80 anos do triunfo soviético sobre a Alemanha nazista. O evento ganhou importância estratégica em 2025, com a presença confirmada de ao menos 20 líderes estrangeiros, incluindo Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil, e Xi Jinping, presidente da China. A escolha de convidados, majoritariamente do Sul Global, revela intenções políticas claras do Kremlin em tempos de guerra e isolamento internacional.
Mostrar força e romper o isolamento
Um dos principais objetivos de Vladimir Putin é reforçar a imagem de que a Rússia não está isolada do cenário internacional, apesar das sanções e críticas do Ocidente devido à guerra contra a Ucrânia. A presença de líderes como Lula e Xi Jinping serve como vitrine para mostrar que a Rússia ainda possui aliados estratégicos e relevantes.
Criar uma frente simbólica contra o Ocidente
Segundo especialistas como Gulnaz Sharafutdinova, da King's College London, a escolha por líderes do Sul Global se encaixa na narrativa do Kremlin de enfrentamento ao “Ocidente imperialista”. Putin busca se colocar como defensor de uma ordem internacional multipolar, na qual países como Brasil, China e Cuba possam exercer maior autonomia política e econômica. Isso reforça a ideia de uma “coalizão com o Hemisfério Sul”.
Reforçar o nacionalismo com memória histórica
Desde 2008, sob o governo de Putin, as celebrações do Dia da Vitória se tornaram eventos militares grandiosos. O desfile na Praça Vermelha é uma demonstração não apenas de armamentos e tropas, mas de uma narrativa histórica que liga o heroísmo da Segunda Guerra Mundial ao conflito atual na Ucrânia. O Kremlin busca associar a luta contra o nazismo no passado à invasão da Ucrânia no presente, sob o argumento de "desnazificação" — uma justificativa amplamente contestada, inclusive pelo fato de o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, ser judeu.
Transmitir controle e estabilidade durante a guerra
Convidar líderes internacionais em meio a uma guerra em curso tem outro efeito simbólico: demonstrar que a Rússia tem condições de garantir segurança e estabilidade. Para Sharafutdinova, isso sinaliza controle sobre a situação, algo importante para a imagem de Putin dentro e fora do país.
Fortalecer alianças e abrir espaço para negociações
O evento também é uma oportunidade de diplomacia paralela. O Kremlin já confirmou reuniões privadas entre Putin e alguns líderes, como Xi Jinping e, possivelmente, Lula. O presidente brasileiro, segundo seu assessor Celso Amorim, levará uma “mensagem de paz” com foco em retomada de negociações entre Rússia e Ucrânia. Apesar disso, analistas apontam que Lula dificilmente terá um papel central nas conversas, pois os protagonistas do conflito continuam sendo Rússia, Ucrânia, Estados Unidos e Europa.
Projeção internacional da Rússia como mediadora alternativa
Mesmo que propostas como a de Brasil e China para uma conferência internacional de paz tenham sido rejeitadas por Kiev, elas servem ao propósito russo de projetar-se como uma alternativa diplomática ao Ocidente. A imagem de Putin ao lado de líderes do Sul Global é parte dessa estratégia de reposicionamento geopolítico.
Polarização e ausências importantes
Apesar da presença de diversos líderes estrangeiros, alguns convites foram recusados. O primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, não comparecerá por conta de tensões com o Paquistão. Donald Trump, ex-presidente dos Estados Unidos, também não participará. A ausência desses nomes ressalta as divisões internacionais diante da política externa russa.
O encontro promovido por Vladimir Putin para o Dia da Vitória em Moscou vai muito além da celebração histórica. Ele representa um movimento estratégico para consolidar alianças com países do Sul Global, fortalecer a narrativa interna de resistência e patriotismo, e, principalmente, apresentar a Rússia como uma potência que desafia a ordem internacional liderada pelo Ocidente. A presença de Lula, Xi e outros líderes oferece ao Kremlin o palco ideal para mostrar ao mundo que ainda possui influência, respaldo e alternativas diplomáticas. Ainda que os efeitos práticos desse gesto político possam ser limitados no curto prazo, a simbologia por trás dele é clara: Putin quer reposicionar a Rússia como pilar de uma nova geopolítica global.