Escolas rejeitam crianças com deficiência: A luta pela inclusão que a lei garante, mas muitas ignoram

A educação inclusiva é um direito garantido por lei no Brasil, mas muitas famílias ainda enfrentam dificuldades para matricular seus filhos com deficiência em escolas regulares. A reportagem da BBC News Brasil revela histórias de pais que foram rejeitados por instituições de ensino públicas e privadas após mencionarem o diagnóstico de seus filhos. Apesar dos avanços legais, como a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), a realidade mostra que a discriminação e a falta de preparo das escolas ainda são obstáculos significativos.
A lei brasileira de inclusão e seus avanços
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A LBI, em vigor desde 2015, proíbe a recusa de matrícula de pessoas com deficiência em escolas regulares. A pena para quem descumpre a lei pode chegar a cinco anos de prisão e multa.
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Graças à legislação, o número de matrículas de crianças e adolescentes com deficiência em escolas comuns saltou de 145 mil (2003) para 1,7 milhão (2023), segundo o Ministério da Educação (MEC).
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A inclusão é também uma recomendação da Unicef e da ONU, sendo adotada em diferentes modelos ao redor do mundo, como no Reino Unido, Finlândia e Canadá.
Os relatos das famílias: Discriminação e dificuldades
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Mães como Malu (nome fictício) relataram ter procurado até 15 escolas no Rio de Janeiro, sendo rejeitadas após mencionarem o diagnóstico do filho, que tem uma síndrome genética. Escolas públicas alegaram falta de recursos, enquanto particulares limitaram vagas por turma.
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Juliana Ghetti, mãe de João (autista não verbal), denunciou o colégio Mackenzie ao Ministério Público de São Paulo após a escola alegar um "limite de três crianças com deficiência por sala". O caso foi somado a outras 11 denúncias similares.
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Carla Rocha Curi relatou que uma escola devolveu o dinheiro da matrícula ao descobrir que seu filho era autista, sugerindo que ele esperasse "mais um ou dois anos" antes de ingressar.
Os desafios das escolas: Falta de preparo e recursos
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Especialistas apontam que as escolas enfrentam dificuldades estruturais, como falta de formação docente, recursos pedagógicos e adaptações físicas.
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Amábile Pacios, da Federação das Escolas Particulares (Fenep), reconhece que os professores não são preparados na graduação para lidar com a diversidade, deixando a capacitação a cargo das instituições.
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A presença de acompanhantes terapêuticos, garantida por lei, também gera conflitos. Luana (nome fictício) desistiu de matricular a filha no colégio Equipe (SP) após a escola recusar a entrada de um profissional contratado pela família.
O copo meio cheio: Avanços e desafios
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Dados mostram que 91% das crianças com deficiência estão em escolas regulares, sendo 85% na rede pública. No estado de São Paulo, o número de matrículas mais que dobrou na última década.
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Porém, apenas 6,5% dos professores têm formação em educação inclusiva, segundo Carolina Videira, fundadora da Turma do Jiló. Isso revela que muitas escolas estão apenas "inserindo" alunos, sem de fato incluí-los.
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Especialistas defendem maior investimento em capacitação, infraestrutura e políticas públicas para que a inclusão seja efetiva.
Apesar dos avanços legais, a inclusão de crianças com deficiência nas escolas brasileiras ainda esbarra em preconceito, falta de preparo e recursos insuficientes. Enquanto famílias lutam pelo direito básico à educação, especialistas alertam que a verdadeira inclusão vai além da matrícula: requer adaptações pedagógicas, formação docente e uma mudança cultural. Caso contrário, o risco é que essas crianças continuem sendo excluídas, perpetuando um ciclo de desigualdade. A aplicação plena da LBI não é apenas uma obrigação legal, mas um passo essencial para construir uma sociedade mais justa e acolhedora