Como São Paulo se tornou o Estado mais rico do Brasil? A história por trás do poder econômico paulista

São Paulo é hoje o estado mais rico do Brasil, com um Produto Interno Bruto (PIB) de R$ 3,5 trilhões em 2024
— valor maior que o da Argentina. Mas nem sempre foi assim. Até o século 19, era uma província pobre e pouco relevante. Como essa transformação ocorreu? A resposta envolve infraestrutura, migração, industrialização e até estratégias políticas. Vamos explorar os fatores que fizeram de São Paulo o coração econômico do país.
O passado obscuro: São Paulo antes do café
No século 19, São Paulo era uma província periférica. O Censo de 1872 registrou apenas 30 mil habitantes na capital, enquanto o Rio de Janeiro tinha 270 mil. A economia paulista era pequena, baseada em uma agricultura menos lucrativa que a de regiões como o Nordeste (cana-de-açúcar) ou Minas Gerais (ouro).
Importância histórica:
- Mostra como uma região pode se transformar radicalmente.
- Destaca que a riqueza não é inevitável, mas resultado de escolhas e circunstâncias.
A revolução do café e o desafio da Serra do Mar
O café chegou a São Paulo no século 19, mas um obstáculo impediu seu crescimento: a Serra do Mar, uma barreira natural que tornava o transporte caro e lento. A solução veio com:
- Estradas e pedágios: Na década de 1830, a descentralização do Império permitiu que São Paulo investisse em estradas, como a Estrada da Maioridade (1846), reduzindo custos.
- Ferrovias: Em 1867, a São Paulo Railway ligou o interior ao Porto de Santos, impulsionando a exportação.
Relevância econômica:
- O café tornou-se o "ouro verde" do estado, financiando a infraestrutura e atraindo investimentos.
- Mostra como logística é crucial para o desenvolvimento regional.
Imigração e mão de obra: Europeus e nordestinos
Com o fim do tráfico de escravizados (1850), São Paulo passou a incentivar a imigração. Entre 1870 e 1970, cerca de 3 milhões de pessoas chegaram, principalmente italianos, japoneses e portugueses.
Impactos:
- Agricultura: Imigrantes trabalharam nas lavouras de café.
- Indústria: Muitos abriram pequenos negócios, estimulando o comércio e a manufatura.
- Diversidade cultural: Transformou São Paulo em um caldeirão étnico.
- Dado curioso: Em 1929, pela primeira vez, o número de migrantes brasileiros (especialmente nordestinos) superou o de estrangeiros.
Industrialização: Da crise de 1929 ao protagonismo
A Grande Depressão (1929) prejudicou as exportações de café, mas beneficiou a indústria paulista. Com dificuldade para importar, o Brasil passou a produzir localmente. São Paulo, que já tinha uma base industrial incipiente, tornou-se o centro fabril do país.
Fatores-chave:
- Políticas protecionistas: Getúlio Vargas (1930–1945) incentivou a indústria nacional.
- Diversificação econômica: Nas décadas de 1970, o estado reduziu a dependência do café, investindo em setores como automotivo e petróleo.
O debate ideológico: Meritocracia ou dominação?
Alguns estudiosos, como a professora Elizabeth Balbachevsky (USP), creditam o sucesso paulista à menor influência do patrimonialismo (mistura de Estado e interesses privados). Outros, como o sociólogo Jessé Souza, veem uma estratégia de dominação simbólica:
- Narrativa da superioridade: A elite paulista promoveu a ideia de que o estado era mais "trabalhador" e "europeu", marginalizando outras regiões.
- Institucionalização: A criação da USP e a valorização dos bandeirantes reforçaram essa imagem.
- Contraponto: Enquanto São Paulo se industrializava, outras regiões sofriam com a falta de investimentos federais.
O legado de São Paulo
São Paulo não se tornou rico por acaso. Sua ascensão foi impulsionada por:
- Infraestrutura: Ferrovias e estradas que venceram a Serra do Mar.
- Café: O grão financiou a primeira onda de desenvolvimento.
- Imigração: Mão de obra e diversificação econômica.
- Industrialização: Adaptação a crises e políticas públicas.
- Narrativa: Uma combinação de mérito real e construção ideológica.
A história paulista é um exemplo de como geografia, política e sociedade se entrelaçam para moldar o poder econômico. Mas também levanta questões sobre desigualdade e concentração de riqueza no Brasil. Se São Paulo é um "milagre" econômico, ele veio com custos — e desafios que permanecem até hoje.