O lado oculto do ChatGPT: Exploração, trauma e impacto ambiental por trás da IA 'Mágica'

Quando interagimos com o ChatGPT, a impressão de que a tecnologia é "mágica" é cuidadosamente cultivada por empresas como a OpenAI, cujo CEO, Sam Altman, usa termos como "sobrenatural" para descrever seus produtos. No entanto, por trás dessa fachada futurista, há uma realidade menos glamorosa: exploração de trabalhadores, consumo desenfreado de recursos naturais e cadeias produtivas opacas. A jornalista e engenheira Karen Hao, autora do livro Empire of AI, investigou esses aspectos em profundidade, revelando um sistema que depende de desigualdades estruturais para funcionar.
A OpenAI: De laboratório de pesquisa a "império" corporativo
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Origem nobre, mudança de rumo: A OpenAI foi fundada como um laboratório sem fins lucrativos, com a missão de desenvolver uma inteligência artificial geral (AGI) que beneficiasse a humanidade. No entanto, após um investimento de
US$ 1 bilhão
da Microsoft em 2019, a empresa passou a priorizar o lucro, abandonando parte de seus ideais iniciais. -
Sigilo e contradições: Hao destacou em seu livro que, apesar do discurso de transparência, a OpenAI opera com alto grau de reserva, especialmente sobre suas práticas comerciais e impactos sociais. A empresa se recusou a colaborar com a apuração do livro, e Altman chegou a descredibilizar publicamente obras críticas como a de Hao.
O lado obscuro do treinamento de IA: Trabalho precarizado e trauma psicológico
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Moderação de conteúdo "grotesca": Para filtrar textos violentos, sexuais e de ódio gerados pela própria IA, a OpenAI e outras empresas terceirizam milhares de trabalhadores em países como Quênia e Colômbia. Eles são expostos a materiais extremamente perturbadores por salários baixíssimos.
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Histórias de vida impactadas: Mophat Okinyi, um queniano contratado para moderar conteúdo sexual, desenvolveu trauma psicológico após ler descrições de abuso infantil e zoofilia. O trabalho arruinou seu casamento e sua saúde mental, levantando a questão: "O que recebi em troca valeu o que perdi?"
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Terceirização do "trabalho sujo": Empresas como a OpenAI usam intermediárias para contratar mão de obra barata, distanciando-se da responsabilidade sobre condições de trabalho degradantes.
O custo ambiental: Data centers e colonialismo digital
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Consumo estratosférico de energia e água: Treinar modelos como o GPT-4 consome tanta eletricidade quanto 70,5 mil casas em países em desenvolvimento. Cada pergunta ao ChatGPT gasta 10 vezes mais energia que uma busca no Google.
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Impacto em comunidades vulneráveis: No Chile, um data center do Google foi barrado após protestos de ativistas, que revelaram que a estrutura consumiria 169 litros de água potável por segundo — mais que o suficiente para abastecer 89 mil pessoas.
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Políticas questionáveis: O Brasil, por exemplo, está incentivando a instalação de data centers com desonerações fiscais, mas sem garantias de sustentabilidade claras.
A resistência e alternativas possíveis
Não é inevitável: Hao enfatiza que a IA é resultado de escolhas humanas, não de um destino inexorável. Movimentos de artistas, educadores e ativistas estão questionando seu uso indiscriminado.
Caminhos mais éticos:
- Modelos de código aberto: Alternativas menos centralizadas e mais transparentes.
- Regulação governamental: Países podem exigir que empresas respeitem direitos trabalhistas e ambientais como condição para operar.
- Consciência do consumidor: Questionar a narrativa das empresas e pressionar por transparência.
Desmistificando a IA para um futuro mais justo
A inteligência artificial não é neutra — ela reflete as desigualdades e abusos do sistema que a produz. O livro de Karen Hao expõe as contradições de uma indústria que fala em "beneficiar a humanidade" enquanto explora trabalhadores e recursos naturais. A mudança depende da pressão social, de regulamentações rigorosas e da busca por modelos tecnológicos que priorizem pessoas acima do lucro. Como Hao afirma:
"Quando você ouvir que a IA é inevitável, lembre-se de que essa narrativa serve aos interesses de quem a criou".