"Ninguém nasce mau": O que leva alguém a matar? A ciência que estuda o que a sociedade ignora

O artigo, escrito pela psiquiatra forense Dra. Gwen Adshead, aborda a natureza da violência humana a partir de casos reais, como o dos irmãos Erik e Lyle Menendez, que assassinaram os pais em 1989. A história, recentemente revisitada pela Netflix, reacendeu debates sobre se criminosos são "monstros" natos ou produtos de circunstâncias. A autora, com três décadas de experiência tratando assassinos, desafia a ideia de que a maldade é inata, propondo uma análise mais nuanceada.
A dualidade na percepção dos criminosos
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Os Menendez foram retratados de formas opostas: A tia pediu sua libertação, enquanto o tio os chamou de "sangue-frio". Essa divergência ilustra a dificuldade em categorizar criminosos.
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A mídia frequentemente reduz assassinos a figuras monstruosas (como Harold Shipman ou Lucy Letby), mas a realidade é mais complexa.
A lição de Tony: Trauma e vulnerabilidade
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Um dos pacientes da Dra. Adshead, Tony, havia cometido três assassinatos, incluindo uma decapitação. Inicialmente fechado, ele revelou, em terapia, pesadelos sobre o pai abusivo.
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Seu caso mostrou que mesmo criminosos violentos podem buscar ajuda e expressar arrependimento, contradizendo o estereótipo do psicopata insensível.
Psicopatia e mitos comuns
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A psicopatia é rara entre assassinos. Muitos, como Tony, têm histórico de trauma e emoções complexas, diferindo da frieza associada a psicopatas.
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A violência raramente é premeditada; frequentemente surge de impulsos desencadeados por fatores específicos.
Os "cadeados da violência": Fatores de risco
A autora usa a metáfora de um cadeado de bicicleta para explicar como múltiplos fatores se alinham para desencadear violência:
1.
Fatores sociodemográficos: Ser jovem, homem e ter histórico de conflitos familiares.
2.
Substâncias: Uso de álcool e drogas, que reduzem inibições.
3.
Relações: Conflitos íntimos (a maioria dos assassinatos envolve conhecidos).
4.
Gatilhos imediatos: Um comentário ou evento trivial (como uma derrota esportiva, que aumenta agressões domésticas).
Redução da violência: progressos e prevenção
Estatísticas mostram queda nas taxas de homicídio no Reino Unido e EUA desde 2004, graças a:
- Menor consumo de álcool entre jovens.
- Avanços tecnológicos (como câmeras e celulares).
- Mudanças culturais contra violência de gênero e bullying.
Terapias em grupo, como as conduzidas por Adshead no Broadmoor Hospital, ajudam criminosos a desenvolver empatia e assumir responsabilidade.
Empatia radical: A chave para entender e prevenir
- A autora defende que rotular criminosos como "monstros" impede a compreensão das causas profundas da violência.
- Histórias como a de Jack, que matou a mãe durante um episódio psicótico e depois expressou profundo arrependimento, mostram que até atos extremos podem ser contextualizados.
- Compreender narrativas distorcidas e intervir em fatores de risco é essencial para reduzir reincidências.
Ninguém nasce mau, mas todos podem ser violentos
A Dra. Adshead conclui que a violência é um estado mental temporário, não uma identidade fixa. Enquanto sociedade, devemos evitar simplificações e buscar intervenções baseadas em evidências. A empatia radical — entender as histórias por trás dos crimes — não justifica atos violentos, mas oferece caminhos para prevenção e redenção. Como ela afirma: "Não existem pessoas más, apenas mentes em estados maus".