Israel x Irã: Até quando a "Paz armada" segurará a próxima guerra?

A recente escalada militar entre Israel e Irã reacendeu um debate crucial nas Relações Internacionais: a eficácia da "paz armada", estratégia que sustenta a estabilidade pela ameaça de destruição mútua. No Oriente Médio, região marcada por conflitos históricos e rivalidades ideológicas, essa lógica é posta à prova. O artigo de Alexandre Ramos Coelho, professor da FESPSP, analisa os riscos e as limitações dessa abordagem, destacando a complexidade de aplicar a dissuasão nuclear em um contexto tão fragmentado.
A teoria da dissuasão nuclear: Fundamentos e críticas
A dissuasão nuclear baseia-se em três pilares:
1.
Racionalidade dos líderes: Acredita-se que atores estatais evitarão conflitos catastróficos por cálculo estratégico.
2.
Comunicação clara: As ameaças devem ser críveis e compreendidas pelo adversário.
3.
Alternativas políticas: Deve haver opções viáveis além da guerra.
Relevância:
- Durante a Guerra Fria, essa lógica evitou um conflito direto entre EUA e URSS.
- Kenneth Waltz, teórico realista, defendeu que a proliferação nuclear poderia estabilizar regiões como o Oriente Médio, criando um equilíbrio de poder (como entre Israel e Irã).
Críticas:
- Charles Glaser (George Washington University) alerta que o Oriente Médio carece de mecanismos de comunicação confiáveis e instituições estáveis, essenciais para a dissuasão.
- Scott Sagan (Stanford) destaca riscos de acidentes ou uso não autorizado em Estados com controles civis frágeis.
Casos comparados: Lições de outras regiões
Índia e Paquistão:
- A dissuasão nuclear evitou guerras em larga escala desde 1998, mas crises como Kargil (1999) mostram limites.
- Diferencial: Canais de diálogo e certa previsibilidade política, ausentes no Oriente Médio.
Península Coreana:
- A Coreia do Norte usa armas nucleares como dissuasão, mas a instabilidade persiste.
- A possível nuclearização da Coreia do Sul poderia desencadear uma corrida armamentista regional.
Ucrânia:
- O abandono de armas nucleares em 1994 (Memorando de Budapeste) deixou o país vulnerável à invasão russa (2022), evidenciando a fragilidade de garantias internacionais sem dissuasão própria.
Israel E Irã: Um equilíbrio perigoso
Contexto atual:
- Israel mantém ambiguidade nuclear, mas é reconhecido como potência atômica desde os anos 1970.
- O Irã avança no enriquecimento de urânio, gerando temores de proliferação (relatório da IAEA, 2025).
Riscos:
- Geopolítica: A Arábia Saudita pode buscar armas nucleares se o Irã as desenvolver, ampliando a corrida armamentista.
- Instabilidade interna: Netanyahu usa a guerra para consolidar apoio doméstico, enquanto o Irã enfrenta pressões por retaliação após ataques israelenses.
A frágil trégua e o futuro da região
O cessar-fogo mediado por Donald Trump em 2025 é visto como temporário, com violações registradas horas após o anúncio.
Desafios:
- Falta de diálogo direto: Sem mecanismos diplomáticos estruturados, a escalada pode retornar.
- Assimetrias: Israel não é signatário do TNP, enquanto o Irã é acusado de descumprir acordos.
Propostas:
- Inclusão de Israel no TNP para aumentar transparência.
- Criação de fóruns regionais de mediação, com participação de potências globais.
Até quando a paz armada sustentará a estabilidade?
A dissuasão nuclear no Oriente Médio é uma aposta arriscada, dada a falta de instituições estáveis e a profundidade das rivalidades. Enquanto a ameaça mútua pode evitar conflitos imediatos, ela não resolve tensões históricas nem substitui a diplomacia. Casos como Índia-Paquistão mostram que a dissuasão exige canais de comunicação robustos – algo ausente entre Israel e Irã. Sem avanços diplomáticos, a região permanecerá refém de um equilíbrio frágil, onde a próxima crise pode ser apenas uma questão de tempo.